Instituições de Ensino são espaços violentos e excludentes para pessoas trans e travestis

28/06/2023

A dificuldade no acesso e permanência da população LGBTQIAP+ aos espaços educacionais é um demarcador do quão desigual é a sociedade brasileira. Desde a Educação Básica até o Ensino Superior, os dados mostram que as instituições têm se configurado como espaços violentos, o que impulsiona a evasão ou nem sequer possibilitam a entrada desta população. Para trans e travestis os números são ainda mais estarrecedores.

 

Segundo pesquisa realizada pela Rede Nacional de Pessoas Trans do Brasil, 82% das pessoas trans abandonam o Ensino Médio entre os 14 e os 18 anos. Os dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), de 2022, são ainda mais reveladores. A pesquisa mostra que cerca de 70% das pessoas trans e travestis não concluíram o Ensino Médio e apenas 0,02% dessa população teve acesso ao ensino superior. Os números mostram ainda que muito desta violência é praticada por docentes e gestoras (es) da instituição, além das situações vividas entre estudantes.

 

Para o professor da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Gean Santana, as instituições de ensino, de modo geral, não estão preparadas para acolher o que foge à norma, principalmente, no que diz respeito aos parâmetros estabelecidos para definir determinados modelos de corpo e sexualidade. O resultado disso é a evasão destes espaços. No programa de rádio Viração, produzido pela Assessoria de Imprensa da Associação dos Docentes da Universidade Federal de Pelotas (Adufpel), o professor fez uma reflexão sobre os desafios para permanência da população LGBTQIA+ na universidade.

 

 “Quanto mais afastado do padrão, mas difícil será estar nesses espaços. Podemos mencionar logo de cara a população trans. As pessoas trans e travestis que fogem totalmente a esta lógica estabelecida entre corpo biológico, sexualidade, orientação sexual e identidade de gênero. Podemos afirmar, com certeza, que estas pessoas trans sequer conseguem finalizar o Ensino Médio, quanto mais acessar o Ensino Superior. Podemos contar nas pontas dos dedos as pessoas trans que são doutoras, infelizmente. Isso porque elas são expulsas do espaço escolar. Muitas vezes, antes do espaço escolar, são expulsas do próprio convívio familiar”, afirma o professor.

 

De acordo com dados da Antra, a estimativa é que haja no Brasil, em 2023, somente 15 mulheres trans e travestis doutoras. Os índices de evasão e falta de acesso são importantes demarcadores para compreendermos o nível de violência pedagógica que constituem as instituições de ensino. O conceito de pedagogia da violência, por sinal, é amplamente debatido pela pesquisadora Luma Nogueira de Andrade, primeira travesti doutora do país que, atualmente é professora adjunta da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB/Ceará), autora do livro Travestis nas Escolas: Assujeitamento e Resistência à Ordem Normativa. Recentemente, a professora Luma veio a público denunciar uma série de episódios de transfobia que estaria sofrendo da própria reitoria da UNILAB, o que confirma o quanto mesmo com a ascensão social, estas pessoas continuam sendo vítimas de processos violentos por partes das instituições.

 

Para o professor Gean Santana, é o preconceito e a dificuldade de lidarmos com a diversidade humana e, principalmente, no campo da sexualidade os fatores determinantes para afastar a população LGBTQIAP+ dos espaços escolares e universitários. “Muitos conseguem permanecer, mas para permanecer, muitas vezes, a gente precisa omitir a identidade de gênero, a nossa sexualidade, orientação sexual, para evitar sofrer violências nestes espaços. E mesmo não sofrendo diretamente essas formas de violações, a gente vivencia brincadeiras LGBTQIAfóbicas, escutamos piadas, seja do corpo docente, seja dos colegas estudantes, seja do corpo funcional das instituições”.

 

O episódio Viração 176 - Igualdade, desafios e permanência da população LGBTQIA+ na universidade com a entrevista na íntegra do professor Gean Santana pode ser acessado gratuitamente clicando aqui.

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