Governo da Bahia ameaça docentes e estudantes para forçar retorno às aulas presenciais mesmo com pandemia descontrolada

20/07/2021

Na última semana, o governador Rui Costa permitiu o retorno das aulas presenciais nas instituições de ensino da rede estadual a partir do dia 26 de julho. De acordo com o decreto, as aulas devem acontecer em modelo híbrido, com alternância de dias entre estudantes. Com pouco mais de 36% da população acima de 18 anos vacinada com a segunda dose e diante do risco iminente da disseminação em todo o país da variante Delta, identificada inicialmente na Índia, e já encontrada no Brasil, o governo baiano expõe milhões de vidas ao pressionar a comunidade estudantil, inclusive por meio de chantagem, a voltar para as salas de aula nesse momento.

 

A Bahia vai na contramão de países que estão com a vacinação avançada como Israel e Reino Unido, que voltaram a adotar restrições em relação à flexibilização das medidas sanitárias de segurança por conta da disseminação da Delta que comprovadamente é 50% mais contagiosa do que a Gama, variante identificada inicialmente em Manaus que é dominante nos casos brasileiros. Embora ainda não haja estudos conclusivos sobre a maior letalidade da Delta em relação às demais variantes, a opinião dos especialistas é a de que o aumento exponencial dos casos inevitavelmente culmina em mais pacientes necessitando de atendimento médico e internações, por consequência, em mortes.

 

Desde o dia 25 de junho, a média de casos e mortes estão em baixa na maioria dos estados brasileiros. A importante redução diante de meses de alta letalidade como foi o primeiro semestre de 2021 já apontam para os resultados da imunização, apesar disso, a média de mortes ainda permanece em um alto patamar, acima de mil perdas diárias. Apesar disso, o governador Rui Costa se apressou em liberar o retorno à volta às aulas, ameaçando os/as docentes que se recusarem a arriscar suas vidas e de seus entes nas salas de aula, com cortes de salários. Em um cenário de aumento do desemprego, fome e miséria se alastrando por todo cenário nacional, impulsionados por uma alta de preços substancial da cesta básica, gás de cozinha e gasolina, ameaçar docentes com cortes de salário é mais uma das perversidades que não surpreende em um governo marcado por falta de diálogo, arrocho salarial e ataques à classe trabalhadora.

 

A crueldade do governo ultrapassou todos os limites, no entanto, com o recado dado pelo secretário da Educação, o professor da Uefs, Jerônimo Rodrigues, que veio a público informar que estudantes que não comparecerem às escolas terão o auxílio estudantil de R$ 150 cortado. O Bolsa Presença é um benefício concedido pelo Governo do Estado para estudantes em condição de vulnerabilidade socioeconômica que estão no Cadastro Único. A insegurança alimentar entre estudantes brasileiros aumentou com a pandemia, segundo pesquisa coordenada pelo Grupo de Pesquisa Alimento para Justiça da Universidade Livre de Berlim, na Alemanha, em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e com a Universidade de Brasília (UnB). Entre agosto e dezembro de 2020, quase 60% dos domicílios brasileiros apresentavam algum grau de insegurança. Com a suspensão das aulas, cerca de 2,7 milhões de estudantes perderam a merenda e precisam contar com a ajuda de terceiros para comer.

 

A vergonhosa ameaça proferida pelo secretário Jerônimo Rodrigues aos estudantes e suas famílias expõe mais uma vez a perversa face de um governo que se utiliza da miséria de seu povo para conseguir fazer valer sua vontade por meio da opressão. Quando chantageia a população a enviar seus filhos e filhas à escola mesmo em condições insalubres diante de uma pandemia ainda descontrolada, o governador Rui Costa impõe que se escolham entre a fome e o risco de contaminação. Sim, porque não há condições reais de retorno neste momento. O governador se alinha ao presidente Bolsonaro ao submeter a população a riscos iminentes para garantir que seu arrobo autoritário, irresponsável e genocida seja posto em prática mesmo contra todas as evidências de que pode colaborar com o aumento de casos e mortes em todo o Estado.

 

A precipitação de retorno já foi constatada em cidades que, mesmo sob protesto de docentes, insistiram no retorno e viram o número de mortos entre profissionais de educação e estudantes aumentar. A situação ocorreu em São Paulo e Minas Gerais no primeiro semestre deste ano. As superlotações no ônibus, o contato diário no ambiente escolar e a falta de controle sobre estudantes que se reencontraram após mais de um ano fora das escolas, são um risco previsível que pode comprometer a sobrevivência de toda a população.

 

O argumento de que a primeira dose para profissionais da Educação seria suficiente para protegê-los é equivocada até mesmo porque uma única dose não garante a imunização, sem contar que essa exposição ampliaria o risco para seus  familiares, uma vez que a vacinação ocorre em passos lentos e de forma desigual no Brasil. Ainda que com imunização completa, com o descontrole da pandemia, uma pessoa vacinada pode transmitir o vírus e ampliar a cadeia de contaminação e mortes. Enquanto países como Israel já estudam a possibilidade de aplicar uma terceira dose de imunizante já que a variante Delta sinaliza para um quadro a curto prazo em que novas variantes escaparão à imunização e podem tornar as vacinas ineficientes, o estado da Bahia quer obrigar a comunidade estudantil a se lançar à própria sorte com o vírus nos pontos de ônibus, nas escolas e dentro de seus lares.

 

Apesar das ameaças, os/as docentes não irão ceder. O Fórum das ADs reforçou suaposição contrária ao retorno, enfatizando a imunização completa da população, controle da pandemia e garantia rígida das medidas sanitárias de segurança como condicionantes para o retorno às aulas presenciais. Na mesma linha, o Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado da Bahia (APLB) já afirmou que não retornará às atividades presenciais sem a imunização completa e a garantia dos protocolos de segurança.

 

Em entrevista à Rádio Metrópole, no último sábado (17), a professora Ronalda Barreto da UNEB, coordenadora do Fórum das ADs. falou sobre a indignação dos/as docentes com a liberação das aulas presenciais. A professora chamou a atenção para o fato de que toda a categoria deseja a reabertura das escolas, mas para isso é necessário a garantia de segurança. Todos os comunicados feitos até então sobre a estrutura implementada nas instituições mostram a fragilidade dos protocolos que estão sendo adotados em que faltam, por exemplo, testagem de profissionais e estudantes, vigilância epidemiológica e até condições estruturais como salas ventiladas. As más condições estruturais das escolas são um reflexo das políticas de arrocho do governo estadual que através de cortes orçamentários recorrentes promove o sucateamento das instituições públicas de ensino. A professora destacou que as associações docentes estão abertas ao diálogo com o governo para que as condições ideais sejam criadas para o retorno. Enquanto isso, não há outra alternativa senão a recusa e a indignação com a pressão exercida pelo governador e seus aliados. Mantemos o compromisso da defesa irrestrita à vida, nos solidarizando com docentes da rede estadual e municipal que se recusarem a retornar para as salas de aula e permanecemos seguindo as diretrizes nacionais do Andes-SN, no entendimento de que enquanto não houver condições de biossegurança asseguradas, não será aceitável a volta às aulas presenciais, ainda que seja necessária a adoção de uma greve sanitária docente.

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