Nota de Repúdio à violência contra a mulher e convocação à luta para impedir novos casos

21/08/2023

O aumento da violência na Bahia tem ganhado maior visibilidade em decorrência da divulgação dos dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública que apontam para um crescimento significativo dos casos de morte, principalmente, em decorrência de ações policiais. Em paralelo a estes números, é perceptível que a violência de gênero tem se ampliado, não apenas no Estado. Casos letais, como o assassinato brutal da Ialorixá Bernadete Pacífico, seguem acompanhados de diversos outros episódios bárbaros que fazem mais vítimas do feminicídio em um país em que uma mulher é morta a cada quatro horas.

Embora estes sejam números mais assustadores, as violências múltiplas contra as mulheres não se resumem à morte física, no ato do feminicídio. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 18 milhões de mulheres sofreram violência no último ano. São mais de 50 mil vítimas por dia de diversos outros tipos de violência que não necessariamente compõem as estatísticas. Seja através da violência física, psicológica, moral, sexual, política ou patrimonial, o fato é que estamos diante de um quadro em que as violências visíveis e invisíveis para o sistema têm retirado o direito à sobrevivência digna e à vida de mulheres.

Em Feira de Santana, o quadro se repete. Cotidianamente, dentro da Associação das e dos Docentes da UEFS (Adufs), tomamos conhecimento de inúmeros casos de violências que ocorrem dentro e fora da universidade. Professoras, técnicas, analistas, estudantes e demais funcionárias que são vítimas de assédio de diversas naturezas; denúncias de violência política envolvendo parlamentares locais, como foi o caso da denúncia feita na última sexta-feira (18), pela vereadora Eremita Mota, que afirma estar sofrendo repetidas violências psicológicas e agressões verbais de outros vereadores desde que tomou posse no início de janeiro; e casos ligados a pessoas que fazem parte da comunidade acadêmica e estão enfrentando perseguições e outros tipos de violência. No limite da nossa atuação enquanto sindicato, acolhemos as denúncias relacionadas ao corpo docente que ocorrem no âmbito administrativo e, por meio da nossa Assessoria Jurídica, oferecemos apoio para que medidas cabíveis sejam tomadas.

No campo político, para acolher aquelas a quem não podemos estender serviços que são regimentalmente restritos, temos um vasto histórico de mobilização em defesa dos direitos das mulheres, sejam elas cis, trans ou travestis, nos colocando na oposição radical a qualquer atitude machista e/ou misógina que tente cercear o livre direito à vida digna. Isso se estende às nossas associadas, corpo técnico, prestadoras de serviço, todas as companheiras que junto a nós têm somado nas frentes de luta e àquelas de quem tomamos conhecimento no nosso cotidiano. Não nos furtamos ao enfrentamento da violência contra a mulher e não admitimos que este padrão patriarcal se sobreponha aos nossos princípios basilares de fortalecer a luta dos movimentos de mulheres nos mais diversos espaços.

Defendemos o bem-viver das mulheres e nestes 42 anos de fundação temos nos empenhado para alinhar nossas práticas diárias na busca por ampliação de representatividade e maior participação feminina nos espaços de poder e decisão. Somos vigilantes quanto à manutenção de práticas de reparação nas mobilizações e também entendemos que no campo da linguística, da representação audiovisual, da nossa voz enquanto entidade, isso deve ser implementando. Pelo nosso histórico de lutas, reconhecemos que a nossa sede e as (os) nossas (os) representantes muitas vezes são procuradas(os) para demandas que excedem nossa capacidade de atuação. Ainda assim, somos escuta ativa e temos nos empenhado para fortalecer laços de solidariedade com a classe trabalhadora para manter o vigor de movimentos que a nós se somam.

No entanto, o cenário é complexo. Se por um lado celebramos os 17 anos da Lei da Maria da Penha, por outro, questionamos a eficácia dos aparelhos de segurança para coibir que os feminicídios ocorram, mesmo com mulheres estando sob medidas protetivas. Ao mesmo tempo que reconhecemos a universidade com contornos mais diversos, trazendo uma travesti negra para proferir a Aula Magna, acompanhamos também denúncias de estudantes que ameaçam seus pares por não reconhecer a importância da utilização da linguagem neutra para melhor representar os gêneros diversos. O aumento da representatividade na política com mulheres travestis e trans ocupando posições no parlamento vem acompanhado também da violência transfóbica como ocorre constantemente com a deputada federal pelo PSOL, Erika Hilton. À medida em que a diversidade dá mais um passo na ocupação de mais lugares por mulheres cis, travestis e trans, o conservadorismo se acentua com medo de perder mais espaço e, consequentemente, mais poder e controle social.

Por reconhecer que a escalada da violência contra as mulheres se amplia na medida em que mais mulheres – mais de nós – ocupam os locais que outrora eram apenas reconhecidos e aceitos como espaços masculinos, é que reiteramos nosso compromisso de seguir no enfrentamento, firmes no objetivo de lutar pela igualdade entre os gêneros e pela construção de mais políticas de reparação, inclusão e, sobretudo, pelo direito à vida. 

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