Lei das Cotas completa 10 anos com muitos desafios para alcançar a equidade nas universidades
31/08/2022
Sancionada em agosto de
2012, a Lei de Cotas garante a reserva de vagas nas instituições federais da
educação superior para estudantes de escolas públicas, negras e negros,
indígenas, pessoas com deficiência e de baixa renda. Nestes dez anos, é
inegável que a Lei ampliou substancialmente a participação de identidades
minoritárias ao proporcionar o acesso que resultou em números superiores às
expectativas dos que eram contrários à aprovação da Lei. Estes apostavam no
baixo rendimento das (os) cotistas, mas as pesquisas apontam que a ampliação do
acesso não incidiu em qualquer impacto negativo no desempenho das (dos)
estudantes. Pelo contrário, o desempenho de cotistas é superior.
Entre os anos de 2013 e
2019, o aumento de estudantes que além de serem egressos de escola pública,
fazem parte de família de baixa renda, são também negros ou indígenas, é de
205%. O índice de cotistas que desistem nos anos iniciais é de 9%, menor do que
o de não-cotistas, que é de 10%.
Houve grande
resistência de parte da sociedade que se opunha à aprovação da Lei e forte
pressão dos movimentos negros na defesa pela reparação histórica. A sanção veio
com o reconhecimento, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), sobre a
constitucionalidade da Lei de Cotas, após forte defesa na Câmara e no Senado,
com apoio da presidenta Dilma Rousseff. Algumas iniciativas de reserva de vagas
já eram experimentadas em universidades do país, anterior à Lei de Cotas, mas
com a mesma este processo foi ampliado em larga escala a partir de 2016.
A implantação das políticas
de acesso veio acompanhada da necessidade de aumento das políticas de
permanência. Sem dúvidas, visualizamos em muitas instituições uma mudança na
fotografia que denota a mudança identitária no perfil dos estudantes. Por outro
lado, ainda há uma ausência significativa de enfrentamento das instituições às
pautas que envolvam situações de racismo, machismo e demais opressões que
intercruzam a sobrevivência das minorias, considerando a interseccionalidade.
Além disso, os
currículos dos cursos, com exceções, permanecem invisibilizando referências
intelectuais negras, indígenas, asiáticas, numa perspectiva excludente das
relações em que o conhecimento permanece sendo pautado por correntes brancas,
heteronormativas e geograficamente localizadas no eixo de países europeus e os
dois norte-americanos de maioria anglófona. Apesar da reivindicação constante
de pesquisadoras (es), docentes e estudantes que estão engajados nas lutas
inclusivas, ainda há grande resistência para se alterar os parâmetros curriculares.
O racismo continua sendo negligenciado, ainda que não sem enfrentamento dos
grupos antirracistas organizados.
A presença de docentes
negras (os) também é um desafio a ser enfrentado. Embora os avanços promovidos
pelas políticas afirmativas tenham tido impactos direto na identidade dos
estudantes; em 2021, levantamento feito pelo Estadão mostrou
que menos de 3% das instituições de ensino superior brasileiras têm professoras
(es) negras (os), o que espelha a distribuição racial da região onde estão
localizadas.
A
proposta da criação da Lei de Cotas é que em algum momento ela deixe de ser
necessária; ainda não chegamos nesse ponto. Com os dez anos completos da Lei,
há a possibilidade de que seja submetida a uma revisão; o que não é
obrigatória. Não obstante, representantes de movimentos negros reivindicam
alterações no texto para maior ampliação do acesso como, por exemplo, a
expansão da reserva nos cursos de pós-graduação.
Embora o crescimento
nos cursos de graduação tenha sido de mais de 400%, na pós-graduação o aumento
de negras (os) foi inferior a 30%, segundo dados da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
Em período eleitoral,
discute-se sobre possíveis armadilhas que possam vir através de uma revisão
permeada de interesses convenientes para o momento, já que uma parte
conservadora da sociedade representada por parlamentares são contrários à Lei.
Por enquanto, não há consenso sobre um período para a revisão da Lei de Cotas.