Tentativa de expulsão de feirantes das ruas de Feira de Santana pela prefeitura representa apagamento cultural e histórico do município
17/11/2021
Após sucessivas ameaças e
falta de diálogo, o prefeito de Feira de Santana, Colbert Martins, estabeleceu
um prazo para a remoção final de feirantes que ocupam as ruas da cidade. A data
limite para a saída daqueles/as que ocupam vias públicas, inclusive da Rua
Marechal Deodoro, era dia 21 de novembro de 2021. A decisão unilateral de levá-los/las
para o Centro de Abastecimento desconsidera as constantes reivindicações dos
trabalhadores e trabalhadoras que vêm se mobilizando na defesa pela organização
dos espaços e não remoção forçada para um local que não apresenta condições
adequadas nem de segurança para o desenvolvimento de suas atividades. Após
intensa mobilização dos/das feirantes, o prefeito retrocedeu em relação ao
prazo final.
Diante da pressão
exercida pelo movimento organizado dos trabalhadores e trabalhadoras informais,
o prefeito Colbert Martins, pela primeira vez, recebeu os/as feirantes da rua
Marechal Deodoro para dialogar sobre a situação. O encontro propositivo fez com
que o prefeito se comprometesse a não fazer a remoção até o prazo inicialmente
decretado pela gestão, e rever seu posicionamento de retirada dos/das
trabalhadoras do local. Uma comitiva de feirantes será levada para Salvador
para observar como o modelo da feira da Praça 02 de Julho é realizada. Os/as
feirantes e apoiadores/as defendem a manutenção da feira em determinado espaço
do centro com desmontagem das barracas no final do dia.
A vitória é significativa
e fruto da mobilização dos trabalhadores e trabalhadoras que junto a
organizações, movimentos sociais, apoiadores/as civis e do legislativo
conseguiram viabilizar possibilidades de diálogo. Como ainda não se trata de
uma decisão definitiva, o enfrentamento permanece até que uma solução viável e
inclusiva seja adotada.
O processo de
descaracterização que Feira de Santana vem enfrentando com as obras do "Novo
Centro", denominação do projeto de requalificação das ruas do centro,
desenvolvido pelo governo municipal, evidencia a veia autoritária e perversa da
gestão. Em meio à pandemia, diante de uma das maiores crises humanitárias já
enfrentadas pelo país, Colbert Martins prioriza a limpeza estética da cidade,
sem levar em consideração a opinião de trabalhadores/as que há gerações retiram
seu sustento da informalidade e são responsáveis diretos/as pelo crescimento no
município que comprovadamente ascendeu a partir das feiras de rua. Não por
acaso, o município leva Feira no nome.
Não se trata apenas de um
projeto de requalificação diante da inquestionável necessidade de organização
do comércio de rua, não apenas em benefício de pedestres, motoristas e
proprietários/as de lojas na região central; o que acompanhamos em Feira de
Santana é um notório processo de gentrificação, que, de modo geral, prioriza a
valorização de determinadas áreas urbanas em detrimento de outras e/ou da
população de baixa renda que ali estava localizada e retirava seu sustento.
É revelador que esta ação
que teve início no ano passado tenha proposta de encerramento logo no mês da
Consciência Negra, com a expulsão de trabalhadores e trabalhadoras, em sua maioria
negros e negras, diante de um cenário de desemprego, alta de inflação, miséria
e fome. O país da fila dos ossos e avanços desesperados aos carros de lixo é
uma construção de gestores como Colbert Martins que se perpetuam no poder por
gerações, sem levar em consideração as necessidades mínimas do povo e continuam
privilegiando uma minoria que se regozija com as ruas livres para poder
circular sem se deparar com as vozes ou a "sujeira" daqueles/as que permanecem
na base da pirâmide como mola propulsora para o avanço do capitalismo que os
alimenta.
Enquanto isso, a população
pobre acumula prejuízos. Os/as camelôs que já foram removidos/as da Sales
Barbosa, Praça Bernadino Bahia e outros pontos do centro para o Shopping Popular tem reiteradamente se manifestado
contra as condições abusivas para conseguir trabalhar. Na última semana, em
manifestação na Câmara Municipal, pleitearam a mudança da condição de
inquilinos para permissionários, assim teriam reduções nas taxas que precisam
pagar para atuar no local. Além disso, os/as trabalhadores/as reivindicam a
construção de uma gestão participativa em que possam ter voz e voto na
participação da administração do Shopping Popular.
Nesta terça (16), o
vereador Luiz da Feira (Pros) anunciou durante sessão na Câmara que vai propor
abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar supostas irregularidades
entre a Prefeitura e o Consórcio que administra o Shopping Popular Cidade das
Compras diante das denúncias de arbitrariedade nas relações entre a
administração e os/as trabalhadores/as
A resistência continua.
Os/As ambulantes, principalmente os/as que atuam da Rua Marechal Deodoro,
seguem mobilizados/as pela construção de condições dignas de trabalho sem que a
expulsão e o uso da violência sejam a única alternativa e diante da dificuldade
de diálogo com o executivo, se mobilizam junto ao legislativo para criar
estratégias na luta. O mandato do vereador Jhonatas Monteiro (Psol) tem
reiteradamente levado as denúncias para a plenária da Câmara na tentativa de
reverter o autoritarismo do prefeito Colbert Martins.
A Adufs novamente manifesta
seu total repúdio às atitudes do governo municipal que, mais uma vez, reforça
seu desprezo pela classe trabalhadora. Apoiamos as reivindicações legítimas dos
trabalhadores e trabalhadoras informais de Feira de Santana e somamos esforços
para que as medidas arbitrárias adotadas encontrem um meio termo que não
represente o apagamento cultural da cidade e mais danos para os/as feirantes.