UEFS suspende atividades presenciais até 26 de março; Docentes enfrentam dificuldades para desenvolvimento do ensino remoto
02/03/2021
Em nota publicada na última semana, a Administração Central da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) informou sobre a suspensão de todas as atividades presenciais / práticas de graduação, pesquisa e pós-graduação, no período que teve início no dia 25 de fevereiro e segue até 26 de março. A decisão, segundo a nota, foi baseada nas orientações do Comitê Emergencial de Crise da UEFS após avaliação do cenário atual que apresenta os piores números de contaminação e mortes em todo o país desde o início da pandemia.
Desde o início da pandemia, a Adufs tem defendido sua posição contrária a realização de atividades na Universidade diante dos riscos de contaminação, danos permanentes à saúde e morte das vítimas. Não se trata apenas da comunidade interna, os impactos que podem ser provocados com o aumento do fluxo de pessoas nos ônibus, nas salas de aula e em demais espaços de atuação da universidade podem comprometer a saúde da população em geral. A falácia repetidamente utilizada de que “enquanto os professores não trabalham, a vida segue para todos os demais” é duplamente falsa. Primeiro, porque a vida já não segue há tempos e para muitos: o Brasil já ultrapassou a triste marca de 250 mil vidas interrompidas que carregam consigo outras tantas vidas que já não fazem sentido sem seus entes queridos. Segundo, professores e professoras trabalham sim e muito nessa pandemia.
A defesa intransigente de diversos setores internos da UEFS em conjunto com o apoio da Administração Central levou docentes e discentes para condições laborais incompatíveis com a realidade de muitos deles. É compreensível e legítima a necessidade de realização de atividades na universidade, já que o cenário que se avizinha não parece apontar para a possibilidade de um retorno presencial a curto prazo, no entanto, os relatos que recebemos cotidianamente sobre a situação de professores e estudantes nos faz questionar sobre o alto preço a ser pago para manter as atividades remotas a qualquer custo e em quaisquer condições.
A professora Rosângela Corrêa Rodrigues, do Departamento de Ciências Biológicas da UEFS (DCBIO-UEFS) é uma das docentes que vem enfrentando momentos difíceis para manter suas aulas, pesquisas, projetos de extensão e ainda conciliar tudo isso com a maternidade. Mãe de três filhos ainda muito pequenos ― de idades de 6 e 3 anos e o mais novo com apenas 1 ano de vida ― e sem apoio familiar ou local para deixar as crianças em Feira de Santana, a docente precisa dar conta de tudo sozinha. Segundo Rosângela, o marido trabalha durante o dia todo (7 às 18 horas de segunda a sábado) ficando ela no cuidado dos pequenos o dia todo.
A professora afirma que poderia ter, por direito, uma carga horária menor, visto que têm filhos menores de idade, mas, ela não optou por isso. De acordo com a docente mesmo com todos os afazeres ela se preocupa muito com os estudantes, assim, assumiu 16 horas semanais. “Tenho tido dias bastante sofridos e angustiantes, me sinto extremamente cansada. Mesmo assim, como professora estou também preocupada, principalmente com a situação dos meus alunos; diante dos vários problemas que são relatados por eles. Sei que não era obrigação aceitar a carga horária de 16 horas, visto que por direito legal eu poderia optar por uma carga horária menor. No entanto, senti-me na obrigação de tentar ajudar meus alunos que já estavam há muito tempo sem aulas por conta da Pandemia."
De acordo com a Professora Rosângela, não se trata apenas de ministrar aulas; existe todo um processo anterior à preparação do conteúdo a ser passado aos alunos que demanda bastante tempo. Além disso, a docente atua em diversas frentes de pesquisas dentro e fora da UEFS, bem como na execução de projetos de extensão e em outras demandas que fazem parte do cotidiano na docência. "Passo madrugadas trabalhando para conseguir elaborar as aulas e outras atividades para meus alunos, pois a intenção é ofertar uma disciplina de qualidade, mesmo de forma remota. Além do mais, estou dedicada à outras atividades também, que são necessárias como, por exemplo, a orientação de alunos, execução de projetos de pesquisa e extensão, além da participação em bancas de avaliações — monografias, dissertações e teses. Além disso, sou coordenadora de um projeto de extensão e revisora de revistas científicas. Assim, tenho lutado para fazer estas atividades; pois, tenho errado e acertado também”.
Além do mais, ela conta que várias vezes por dia precisa parar o trabalho para dar atenção aos filhos e que, por conta disso, opta por trabalhar pela madrugada, enquanto os pequenos estão dormindo. A professora disse também que seu equipamento de trabalho (computador) é ultrapassado para muitas tecnologias o que dificulta ainda mais o desempenho. Em seguida, afirma que as condições de trabalho não têm sido apropriadas e faz questão de enfatizar que este momento tem sido muito difícil também para os alunos. “Muitos deles demostram dificuldades para acompanhar as aulas neste novo formato à distância e, dentre as queixas relatadas por eles, a que mais ouço é que a conexão do lugar onde estão não é boa — principalmente dos estudantes que moram na zona rural. Desde a cadeira até um equipamento adequado, muitos professores e muitos alunos têm sentido falta. Tentamos fazer o que é possível e da melhor forma, embora o reconhecimento não exista”, explica. A professora também chama a atenção para as consequências da aplicação da Lei Complementar 173 que barra a contagem de tempo para as progressões de carreira durante a pandemia, embora os docentes continuem exercendo suas atividades. Acrescenta ainda que é desestimulante tudo isso, tendo em vista que não há sequer garantia dos direitos já adquiridos.
Engana-se quem acredita que este momento tem sido conturbado apenas para as mães de filhos pequenos – grupo que comprovadamente acumula maior carga de trabalho na realização do home office – a rotina exaustiva que exige novos aprendizados de ferramentas tecnológicas e adaptações do docente e do ambiente de trabalho que agora se confunde com a casa, se estende.
Para a professora Marilene Rocha, também do DCBIO, são muitos os transtornos provocados que são aumentados pela falta de assistência do Governo em oferecer equipamentos adequados aos docentes: “Aqui em casa só temos um computador, e meu filho, que está no terceiro ano do ensino médio e estuda em escola particular, está tendo aula, então divido o computador com ele. O maior problema aqui é a falta de um ambiente., Então, temos que deslocar minha mãe do quarto para minha filha ter aula. Deste modo, ela fica no meu e faço minha aula na sala. É tudo muito complicado, é cachorro que late, gente que fala; sem falar que a internet fica oscilando muito”, relata a professora Marilene.
As despesas com o Ensino Remoto têm sido altas. Muitos docentes precisam comprar equipamentos para melhorar a apresentação das aulas ou torná-las viáveis embora prover condições para dar viabilidade às aulas seja uma obrigação do Governo do Estado que não só, não a cumpre como cria mais impecilhos para impedir que os docentes tenham acesso às progressões, como é o caso da LC 173. A Adufs reforça sua solidariedade com docentes e estudantes e reafirma seu compromisso com a defesa pela garantia dos direitos, melhores condições de ensino e, sobretudo, com a sobrevivência dos docentes se colocando contra qualquer tentativa de retomada de atividades presenciais sem a vacinação.