Escola sem Partido impõe retrocesso ao ensino
11/08/2016
Os riscos da aprovação de projetos de lei relacionados ao Movimento Escola sem Partido à produção do conhecimento e ao exercício da docência em sala de aula foram pauta do debate “A lei da mordaça e os desafios da educação brasileira”. Os professores Marilene Lopes (DBIO/Uefs) e André Nascimento (DEDU/Uefs), que participaram como mediadores, avaliaram a proposta como um retrocesso por impedir a intervenção pedagógica e a reflexão crítica nas escolas, conforme prevê a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). A atividade aconteceu na Uefs, terça (9).
André Nascimento pontuou brevemente alguns artigos da LDB e o Plano Nacional da Educação para contextualizar os parâmetros legais que orientam a educação brasileira, comparando-os com a proposta do Escola sem Partido. Segundo o docente, o Programa contraria o princípio constitucional do pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, assim como o da liberdade do professor de divulgar os conteúdos no ambiente escolar.
“Essa proposta foi criada sob a alegação da existência de forma sistemática e abusiva de doutrinação política e ideológica nas escolas brasileiras por parte de professores e autores de livros didáticos. Segundo seus princípios, a educação nacional deve tender à neutralidade política, religiosa e ideológica do estado; ao reconhecimento da vulnerabilidade do aluno, que não é tido como protagonista do processo de construção do conhecimento; e à garantia do direito dos pais que seus filhos recebam a educação moral de acordo com suas próprias convicções. Nela, o professor é visto como um indivíduo corruptor e perigoso. Até o concurso para a carreira docente será pautado pela lei. Devemos enfrentar essa proposta danosa e nefasta”, denunciou.
A aprovação, em algumas casas legislativas brasileiras, de projetos de lei que reforçam o Programa também foi ressaltada pelo mediador, que ainda acrescentou que o ponto nefrálgico é a aprovação de leis que proíbem a abordagem e discussão, em sala de aula, das questões que envolvem gênero e sexualidade. “Ele acaba com a escola enquanto espaço público de formação humana, científica e de base filosófica”, indagou.
Em sua fala, a professora Marilene Lopes criticou a proposta do Programa de tornar obrigatória a afixação, nas salas de aula, de um cartaz determinando os deveres do professor, o que, segundo a educadora, é uma forma de controle efetivo do conteúdo abordado nas escolas. “Alguns professores estão com receio de discutir algumas temáticas, como as questões de gênero, com medo de sofrer retaliação. Os envolvidos no Movimento estão criando uma campanha de ódio aos docentes, inclusive com ameaça aos que descumprirem a lei”, registrou, informando que em Alagoas a Assembleia Legislativa já aprovou a Lei Escola sem Partido, que foi vetado pelo governador. O documento foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF) e, na semana passada, a Advocacia-Geral da União (AGU), consultada no processo, considerou-o inconstitucional, porque legisla sobre uma área de competência da União, e porque infringe o artigo 206 da Constituição.
Ao final do debate, foi encaminhada a elaboração de uma moção em repúdio ao Programa. Os presentes foram incitados a lutarem contra o PL, que, caso aprovado, deve ser questionado ao Supremo Tribunal Federal, já que o Ministério Público Federal o considera inconstitucional por estar na contramão dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, especialmente os de construir uma sociedade livre, justa e solidária.
O debate “A lei da mordaça e os desafios da educação brasileira” foi promovido pelo Comitê Local em Defesa da Educação Pública, do qual a diretoria da Adufs faz parte, e pelo Departamento de Educação (DEDU). A atividade fez parte do Dia Nacional de Luta em Defesa da Educação Pública, organizado por centenas de entidades sindicais e movimentos sociais de todo o país contra o programa e outros projetos que tenham a mesma finalidade. O Comitê se reunirá no dia 5 de setembro, às 17h, na Adufs.
Conforme Edson do Espírito Santo, diretor da Associação Docente, o PL criminaliza o professor, restringe as possibilidades de organização do trabalho pedagógico e pensamento crítico na escola, além de fazer parte do conjunto de ataques dos governos ao setor público.
Escola sem Partido
Atualmente, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei 867/2015, que propõe a inclusão, nas diretrizes e bases da Educação brasileira, do Programa “Escola Sem Partido. O documento, idealizado em 2004 por um procurador paulista, embasa outros quatro projetos do tipo, na Câmara dos Deputados, além de outros em assembleias legislativas e câmaras municipais de todo o país.
O Programa torna obrigatória a afixação em todas as salas de aula do ensino fundamental e médio de um cartaz com os deveres do professor no ambiente escolar. O objetivo, segundo o site do Programa, é “informar e conscientizar os estudantes sobre os direitos que correspondem àqueles deveres, a fim de que eles mesmos possam exercer a defesa desses direitos”, já que os professores utilizam o tempo em sala de aula para “fazer a cabeça dos alunos sobre questões de natureza político-partidária, ideológica e moral”.